quinta-feira, 23 de abril de 2020
Barriga de porco fumada (Bacon);
Quando o comediante britânico Al Murray “provou”, não só a existência de Deus como a Sua infinita sabedoria e compaixão através desse maravilhoso milagre gastronómico que é o bacon, estou certo de que ele não fazia sequer uma pálida ideia das vergonhosas mistelas que em Portugal lhe usurpam o nome.
Com a excepção de alguns pequenos fumeiros caseiros ou de dimensão local, quase todos no Norte e de uma honrosa excepção de uma firma minhota de Ponte de Lima, a ganância do lucro fácil e a falta de escrúpulos dos nossos industriais das conservas de carnes transformaram o toucinho fumado num amontoado obsceno de nitratos, nitritos, emulsionantes, dextrose, reguladores de acidez, antioxidantes, fosfatos e polifosfatos sequestradores de água, corantes e o que mais lhe injectam de modo a que, à força de tanta água lá dentro, um quilo de toucinho da barriga produza dois quilos de bacon, quando a regra é exactamente o contrário: dois quilos de barriga fresca produzem, depois da preparação e cura, um quilo de bacon.
Infelizmente, a tal empresa minhota que é honesta na preparação, mal chega ao Sul e, onde chega faz-se pagar como se de negócio de ourivesaria se tratasse.
Para quem, como eu, tem pelo bacon um fervor quase religioso, resta a solução pragmática: se não tens dinheiro para comprá-lo, se o que encontras à venda é imprestável, resta meter mãos à obra e… fazê-lo!
Ingredientes:
Toucinho entremeado
Sal marinho grosso
Açúcar amarelo
Louro, alho em pó, pimenta moída, pimenta da Jamaica
Salitre e ácido cítrico (facultativos)
Fumo
Preparação:
Procure adquirir uma entremeada alta e com bastante gordura, o que nos dias de hoje pode ser um problema dada a magreza cada vez maior destas peças. A solução passa a maior parte das vezes por uma porção deste toucinho que tem ainda algumas costelas de entrecosto agarradas.
Dá mais um pouco de trabalho mas é a parte melhor.
Terá então que retirar esses ossos, que impediriam depois o fatiamento. Com o auxílio de uma faca afiada faça uma incisão ao longo de cada osso,
descarne à volta sempre encostado à costela e puxe de modo a retirá-la.
Estas costelas articulam com umas cartilagens, que ficam na peça.
A mistura de desidratação e tempero não tem uma receita fixa. Costumo usar uma mistura de sal marinho e açúcar amarelo, um pouco mais de sal do que açúcar e tempero como me apetece nesse dia. O verdadeiro tempero do bacon é o fumo, que virá depois. Enquanto parte do sal vai entrar na peça, já o açúcar apenas serve para retirar água à carne, não a adoçando. Quanto mais açúcar puser mais rápida a desidratação e menos salgado fica o bacon final.
Coloque a entremeada num plano inclinado dentro de um tabuleiro,
cubra-a totalmente (também por baixo) com a mistura de açúcar/sal temperada e leve ao frio durante uma semana.
Durante este tempo vai formar-se uma grande quantidade de líquido que vai escorrendo e que deverá esgotar de modo a que a peça nunca fique mergulhada nele o que a salgaria muito. Se aparecerem partes que deixam de estar cobertas, deverá repor nesses locais de modo a assegurar que toda a peça está sempre em contacto com o açúcar/sal.
Ao fim de 6-7 dias, consoante a espessura do toucinho, a carne perdeu grande parte da sua água e está pronta para a fase final, a fumagem.
Lava-se de todo o sal que ainda tem agarrado, deixa-se mergulhada em água durante um par de horas, seca-se cuidadosamente e coloca-se sobre um fumeiro de madeira de azinho, tendo o cuidado de afastar a peça do lume de modo a que receba apenas fumo e não calor.
Usei um fogareiro de carvão sobre o qual ia deitando pedaços de madeira de azinho.
A fumagem demora 2 ou 3 dias,
mais outros tantos para que o fumo se possa espalhar pelo interior e… está pronto o bacon!
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